Antes de
adentrarmos ao tema, estudaremos um pouco o que é aposentadoria para, em
seguida, detalharmos o instituto da desaposentação.
Pois bem.
A aposentadoria por idade é uma prestação previdenciária paga mensalmente ao
segurado que completar 65 anos de idade (homem), reduzido pra 60 anos para o
trabalhador rural e a segurada que completar 60 anos, reduzido para 55 anos de
idade para trabalhadora rural. Sua previsão constitucional vem gravada no
artigo 201, I, § 7º, I, II, in verbis:
“A previdência social será
organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação
obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:
I - cobertura dos eventos de doença,
invalidez, morte e idade avançada;
§ 7º É assegurada aposentadoria no
regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes
condições:
I - trinta e cinco anos de
contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher;
II - sessenta e cinco anos de idade,
se homem, e sessenta anos de idade, se mulher, reduzido em cinco anos o limite
para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas
atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o
garimpeiro e o pescador artesanal.
Em sede infraconstitucional está previsto na Lei nº
8.213/91, que dispõe sobre os planos de benefícios da previdência social e dá
outras providências, nos artigos 18, alínea “a” e “b”; artigo 48 e 52.
Quem está
protegido pela lei: empregado, empregado doméstico, contribuinte individual,
trabalhador avulso, segurado especial e o facultativo, a parir do momento de
sua inscrição.
A
aposentadoria por idade é o benefício previdenciário mais conhecido e tem o
objetivo de garantir ao segurado sua manutenção, bem como de sua família em
caso de idade avançada, tem seu início a partir do momento que o trabalhador,
formal ou informal, está filiado ao sistema previdência.
Em matéria
previdenciária o instituto da filiação representa elemento essencial na relação
jurídica prestacional. Filiar-se quer dizer pertencer, fazer parte, ter
direitos e obrigações frente a um Sistema de Proteção Social. O elo ao seguro
social do qual decorrerá direitos e obrigações recíprocos tem origem com a
atividade econômica remunerada descrita na norma de direito social. Da condição
de segurado da Previdência Social se inicia um liame jurídico estabelecido
entre o segurado e o ente segurador a um objeto associativo, o risco
assegurado.
Concepções
doutrinárias acerca da filiação previdenciária compreendem que este designa uma
vinculação entre uma pessoa física denominada segurada, e uma pessoa jurídica
gestora da proteção social, o ente segurador, no caso o INSS.
A
importância da filiação inclui três categorias de normas que caracterizam a relação
jurídica de seguro social: filiação,
proteção e cotização. A filiação ocorre quando tem lugar o fato da vida
material a que a lei atribui força para vincular o cidadão, que dele participa,
sob certa forma e em certo tempo, a um sistema estatal de proteção.
Existem duas espécies de filiação, a
facultativa e a obrigatória. A filiação facultativa é a volição, quer dizer, o
interesse de filiar-se ao regime previdenciário. A facultatividade é opção do
não segurado obrigatório. A filiação obrigatória ocorre independentemente da
vontade do segurado. Se este exerce uma atividade remunerada abrangida pela
previdência social, resta automaticamente vinculado ao respectivo regime,
promovendo a partir desta ligação jurídica, uma relação de direitos e deveres. Em outras palavras, ao mesmo tempo em
que o titular do seguro social possui direito subjetivo a uma prestação previdenciária,
é também, sujeito passivo, devedor da contribuição previdenciária.
O comando
normativo supramencionado dispõe que, para os segurados obrigatórios a filiação
é automática a partir do momento que passam a exercer uma atividade remunerada,
e para os segurados facultativos a obtenção do reconhecimento da cobertura está
condicionada a inscrição com o pagamento da primeira contribuição sem mora.
Com o
breve relato, acima exposto, passamos a analisar o instituto da desaposentação.
O tema
desaposentação vem sendo bastante discutido na doutrina, na jurisprudência e na
mídia de uma forma geral, assumindo importante relevo no campo do Direito
Previdenciário. A possibilidade de o segurado “desaposentar”, as consequências
dessa opção, os vários benefícios que a admitem, o aproveitamento do tempo de
contribuição anterior e posterior à aposentadoria e a necessidade ou não da
devolução das parcelas percebidas são questões e, ainda não decididas.
O cerne da
questão é saber se os segurados da previdência social possuem vontade livre
para se aposentar e “desaposentar”.
A previdência
social como se sabe, é um seguro, onde existe a necessidade de preenchimento de
condições específicas para o gozo de cada beneficio ou serviço. Sua finalidade
pode ser garantir o mínimo necessário para uma vida digna (previdência mínima)
ou proporcionar conforto, elevado com padrão de vida aos segurados (previdência
máxima), sendo certo que apenas a primeira hipótese encontra-se inserida no rol
dos direitos humanos. Assim sua disciplina é de primordial importância,
influenciando a economia o contexto social e o planejamento estratégico do País.
Uma
Previdência Social, para ser eficiente deve pelo menos assegurar a
aposentadoria e a pensão por morte do segurado. O nosso sistema é um dos mais
completos do mundo, pois oferece proteção contra quase qualquer tipo de risco
social.
O que
ocorre, é que trabalhadores que se aposentam e voltam a exercer atividades
remuneradas, também voltam a contribuir com a previdência social, fazendo com
que, em tese, tivessem a todos os direitos atinentes aos contribuintes
previdenciários, inclusive a desaposentação.
Portanto,
como pode o aposentado que volta a exercer atividade abrangida pelo regime
geral da previdência social, e é seu segurado obrigatório, com todos os
deveres, não ter direito ao mínimo assegurado pela Previdência Social, tal
posicionamento adotado pela Lei e pelo Decreto 3.048/99, fere de modo visceral
o princípio da reciprocidade contributiva retributiva. A Lei 8.213/91 e o
Decreto 3.048/99 são injustos por desrespeitarem o princípio da contraprestação
relativo às contribuições devidas pelos segurados, tendo em vista que as
prestações oferecidas ao aposentado que retorna à atividade são
insignificantes, diante dos valores recolhidos.
E foi
justamente neste contexto que a aposentação
reversa surgiu, em contraposição total a sua face positiva, que é o
direito do segurado a aposentação. A
aposentação reversa ou desaposentação é o direito do segurado ao retorno a
atividade remunerada, desfazendo o ato da aposentadoria por vontade única e
exclusiva do titular.
Assim, o
titular invocando o seu direito optativo, retorna da aposentadoria para o status
quo, para que possa se assim desejar, optar em se aposentar novamente,
utilizando o tempo de contribuição outrora utilizado para a aposentadoria ora
desfeita, ou seja, é o direito que o mesmo tem de se desaposentar, para fins de
aproveitamento do tempo de filiação para nova aposentadoria no mesmo ou em
outro regime previdenciário.
Trata-se
na verdade da possibilidade que o segurado tem de unificar os seus tempos de
serviço/contribuição numa nova aposentadoria.
Exemplo:
um cidadão aposentado pelo RGPS que venha a ser aprovado em concurso público
para auditor fiscal. Pretendendo uma futura aposentadoria como Servidor Público,
com o aproveitamento do tempo do RGPS, deverá renunciar o benefício percebido
pela autarquia (INSS) e requerer a averbação do tempo anterior em novo regime.
Porém,
surge um questionamento: será que este direito a aposentação reversa é previsto
em nossa Constituição? Ou será que este procedimento é legal?
A
Constituição do Brasil, não só não veda tal procedimento, como a mesma garante
a contagem recíproca do tempo na administração e na atividade privada.
A Lei
8.212/91 é omissa em relação ao tema. Apenas o Decreto 3.048/99, em total
ilegalidade, comenta que os benefícios concedidos pela Previdência Social são
irreversíveis e irrenunciáveis.
Contudo,
dando um aspecto administrativo ao tema, podemos facilmente concluir que o ato
de se aposentar é um ato vinculado, pois sendo a lei quem estabelece as
condições para que a mesma ocorra é mais que liquidante que a ocorrência da
aposentação tenha como natureza constitutiva a de ato vinculado.
Sob outro
prisma, uma vez que os requisitos foram cumpridos, e a vontade do agente tenha
se positivado no sentido de se aposentar, a Administração Pública não tem outra
opção a não ser proceder à aposentadoria do segurado.
Assim,
mais que forçoso concluir que a concessão é um ato vinculado e não um ato
discricionário - em que a autoridade que o pratica tem certa iniciativa pessoal
no que se refere à conveniência e oportunidade do mesmo. Ato vinculado é aquele
em que quase não resta iniciativa pessoal para a autoridade que o pratica, vez
que regulado em lei todos os detalhes.
Como ato
vinculado, a aposentadoria é sim irrenunciável e irreversível, mas em relação
apenas a Autarquia e não em relação ao pedido do segurado.
Posto que
como se sabe, um dos aspectos do fato gerador do direito aos proventos é a
vontade do segurado, assim sendo fica claro que, embora vinculado para a
Administração Pública o segurado tem
o poder de analisar a conveniência e a oportunidade diretamente ligadas a sua
vontade e interesse individual e escolher aposentar-se ou não. Do mesmo
modo, o segurado pode optar em estando aposentado em se desaposentar.
A
irrevogabilidade da aposentadoria tem seu escopo principal na proteção do
segurado, que fica garantido contra alterações da análise do mérito do ato
administrativo. Afinal, por conferir fundamental importância à proteção contra
os riscos sociais, o legislador, antecipadamente, já indica com precisão o
motivo e o objeto do ato concessivo.
Assim,
desejando o segurado reconsiderar sua manifestação volitiva, para não mais
continuar aposentado, o binômio constitutivo da aposentadoria ficará novamente
incompleto, posto que embora exista o preenchimento dos elementos legais
(idade, tempo de contribuição e etc...), inexistirá o elemento vontade do
agente. Sendo assim, forçoso concluir que a Administração não poderá a
continuar a pagar o benefício eis que o binômio constitutivo não mais existe.
Desta
feita, podemos facilmente concluir que muito embora o direito aos proventos não
exista mais no mundo fenomênico pela ausência de vontade do agente, o mesmo,
(agente/segurado) continua sendo titular do direito podendo exercer o mesmo a
qualquer tempo.
Muito
embora o INSS continue a entender que a aposentadoria é irrenunciável, dado ao
seu valor alimentar e irreversível por se tratar de um ato administrativo
perfeito e acabado, só podendo ser
desfeito pelo poder público quando constado erro ou fraude.
A
aposentação reversa é absolutamente possível, posto que, ninguém poderá ser
obrigado a permanecer em aposentação contra sua vontade. E mais, normalmente, a
renúncia tem por objetivo a busca por benefício mais vantajoso, pois o segurado
abre mão do benefício, mais não abre mão dos elementos constitutivos da
hipótese de incidência do fato gerador (Por exemplo: tempo de contribuição que
teve averbado).
Prevalece o entendimento de que a
aposentadoria é renunciável quando beneficiar o titular do direito e ou ensejar
a nova aposentadoria mais vantajosa.
Uma vez
entendido ser possível a desaposentação, surge uma nova dúvida que é: Como o
segurado realiza a aposentação reversa? Bom, como se sabe após o requerimento
de aposentadoria, a mesma não precisa ser renovada, sendo entendida como definitiva,
pela Autarquia.
Assim, para que o segurado possa realizar o instituto da
aposentação reversa o mesmo deve apresentar requerimento manifestando a vontade
em se desaposentar.
Uma vez
realizado tal requerimento, deve a Administração
Pública emitir ato administrativo
extintivo ou desconstitutivo, que colocará termo a aposentação.
Pois, como
já se sabe o ato aqui é vinculado, não existindo para a Administração realizar
qualquer forma de análise de oportunidade ou conveniência. Por conseguinte,
cumprido o requisito negativo, qual seja realização de não vontade ou ausência
de vontade, deve a Administração Pública cessar o respectivo benefício.
Assim, o
único elemento necessário para a aposentação ou desaposentação é a vontade do
agente. Caso a Autarquia assim não proceda, deve-se tal pedido ser pedido via
judicial.
Vejamos o
que nossos tribunais têm entendido acerca do tema:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL.
RENÚNCIA A BEBEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. POSSIBILIDADE DIREITO PATRIMONIAL DISPONÍVEL.
ABDICAÇÃO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL PARA CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR
IDADE URBANA Tratando-se de direito patrimonial disponível, é cabível a
renúncia aos benefícios previdenciários. Precedentes. Faz jus o Autor a
renúncia da aposentadoria que atualmente percebe – aposentadoria por idade, na
qualidade de rurícola – para o recebimento de outra mais vantajosa –
aposentadoria por idade de natureza urbana. Recurso especial conhecido e
provido. (REsp n. 310884/RS. Quinta Turma. Relatora Ministra Laurita Vaz. DJ de
26.9.2005).”
“PREVIDENCIÁRIO. RENÚNCIA À
APOSENTADORIA ESPECIAL. CONTAGEM RECÍPROCA DE TEMPO DE SERVIÇO. OBTENÇÃO DE
NOVO BENEFÍCIO. POSSIBILIDADE. Inexiste qualquer ilegalidade no ato de renúncia
à aposentadoria especial. O benefício é um direito disponível do autor, que
dele pode abdicar se assim lhe for conveniente. Encontra-se consolidado o
entendimento de que a contagem recíproca do tempo de contribuição como servidor
público e como empregado celetista não se opõe ao ordenamento jurídico pátrio.
3. Apelação e remessa oficial improvidas. (TRF1ª R. - AC 01001131715 -
(199901001131715) - GO - 1ª T. - Rel. p/Ac. Juiz Manoel José Ferreira Nunes -
DJU 08.05.2003).”
Outra
questão que permeia é: Uma vez concedida a desaposentação os valores percebidos
enquanto o agente encontrava-se em gozo de benefício devem ser devolvidos?
Muito embora, existam entendimentos, pela devolução das parcelas percebidas,
temos o entendimento que as mesmas não devem ser devolvidas, senão vejamos:
1º - Se
não há irregularidade na concessão do benefício não há que se falar em
necessidade de devolução das parcelas percebidas;
2º - Se a
própria lei se silencia acerca da devolução o segurado não esta obrigado a
repor o status quo ante;
3º - Como paradigma
para a não devolução pode utilizar do instituto irmão da reversão do servidor
público, previsto na Lei 8.112/90, que prevê a reversão mais não prevê a
devolução dos proventos percebidos.
E por
último tendo as parcelas pagas do benefício, trato alimentar, estas são
indiscutivelmente devidas no tempo em que o benefício se perdurou, não havendo
razão nem legitimação para sua devolução.
Vejamos o
que Jurisprudência Pátria tem decidido acerca do tema, in verbis:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. DIREITO À RENÚNCIA. EXPEDIÇÃO DE
CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO. CONTAGEM RECÍPROCA. DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS
RECEBIDAS. 1. A
aposentadoria é direito patrimonial disponível, passível de renúncia, portanto.
2. A
abdicação do benefício não atinge o tempo de contribuição. Estando cancelada a
aposentadoria no regime geral, tem a pessoa o direito de ver computado, no
serviço público, o respectivo tempo de contribuição na atividade privada. 3. No
caso, não se cogita a cumulação de benefícios, mas o fim de uma aposentadoria e
o conseqüente início de outra. 4. O ato de renunciar a aposentadoria tem efeito
ex nunc e não gera o dever de
devolver valores, pois, enquanto perdurou a aposentadoria pelo regime geral, os
pagamentos, de natureza alimentar, eram indiscutivelmente devidos. 5. Recurso
especial improvido. (STJ - REsp 692628 - DF - 6ª T. - Rel. Min. Nilson Naves -
DJU 05.09.2005 p. 515).”
“APOSENTADORIA PREVIDENCIÁRIA. RENÚNCIA. TEMPO. APOSENTADORIA
ESTATUTÁRIA. A aposentadoria previdenciária, na qualidade de direito
disponível, pode sujeitar-se à renúncia, o que possibilita a contagem do
respectivo tempo de serviço para fins de aposentadoria estatutária. Note-se não
haver justificativa plausível que demande devolverem-se os valores já
percebidos àquele título e, também, não se tratar de cumulação de benefícios,
pois uma se iniciará quando finda a outra. Precedentes citados: REsp
497.683-PE, DJ 4/8/2003; RMS 17.874-MG, DJ 21/2/2005, e MS 7.711-DF, DJ
9/9/2002. (STJ - REsp 692628 - DF - 6ª T. - Rel. Min. Nilson Naves - julgado em
17.05.2005).”
Assim, qual
for o motivo do segurado a aposentadoria sempre será reversiva, mesmo, nos
casos onde novo benefício não seja pedido.
Posto que,
a possibilidade de se utilizar do instituto da aposentação reversa, além de
estar em total consonância com a Lei, representa, na verdade uma das formas de
proteção social do indivíduo.
Atualmente,
tramita junto ao Supremo Tribunal Federal ação para conversão de aposentadoria proporcional em aposentadoria integral por
meio do instituto da desaposentação, com repercussão geral, que se encontra
empatada sobre o direito à troca de aposentadoria. Dos 11 ministros do
STF, Luís Roberto Barroso e Marco Aurélio votaram a favor de os aposentados
usarem as novas contribuições ao INSS para ganhar mais. Já Dias Toffoli e Teori
Zavascki foram contrários. O julgamento foi interrompido, porque a
ministra Rosa Weber pediu vista dos autos.
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