A
origem do inquérito civil está na Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/85), foi
inspirado no inquérito policial, e serve como mecanismo investigatório para
colheita de informações preparatórias para tomada de iniciativa por parte do
Ministério Público.
Com
efeito, assegura o § 1º do artigo 8º da Lei 7.347/85 que o Ministério Público
poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de
qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, exames ou
perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez)
dias.
É
o inquérito civil procedimento administrativo de natureza inquisitiva tendente
a recolher elementos de prova que ensejem o ajuizamento da ação civil pública.
O
inquérito civil é uma investigação administrativa prévia a cargo do Ministério
Público, que se destina basicamente a colher elementos de convicção para que o
próprio órgão ministerial possa identificar se ocorre circunstância que enseje
eventual propositura de ação civil pública ou coletiva. Porém, o inquérito
civil não se destina apenas a colher prova para ajuizamento da ação civil
pública ou outra medida judicial; tem ele, também, como importante objetivo, a
obtenção de ajustamento de conduta do inquirido às disposições legais, de forma
rápida, informal e econômica.
No
inquérito civil não se caracteriza como procedimento contraditório. Ressalte-se
nele sua informalidade, pois se destina tão-somente a carrear elementos de
convicção para que o próprio órgão ministerial possa identificar se ocorre
circunstância que enseje a propositura de medida judicial de sua iniciativa
que, ademais, é concorrente com a dos demais legitimados ativos à ação civil
pública.
Questão
controversa em inquéritos civis diz respeito ao devido processo legal ou
direito de ampla defesa, com fulcro no inciso LV do artigo 5º da Constituição Federal:
“aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em
geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, como os meios e
recursos a ela inerentes”.
Contudo,
como estabelece a disposição constitucional mencionada, aplica-se somente em
processo judicial ou administrativo, não se tratando o inquérito civil de
processo administrativo e muito menos judicial, não cabendo ao inquirido, por
outro lado, o qualificativo de acusado. Não é o inquérito civil processo, mas,
procedimento administrativo que visa investigar sobre o ato denunciado; não se
fala em acusação, na aplicação de sanção ao inquirido, nem em limitações ou
perda de direitos deste; nele não se decide controvérsia, como ocorre em
processo judicial ou administrativo. Com o inquérito busca-se elementos de
convicção para propositura de eventual medida judicial ou então, configurada a
ilegalidade do ato, a assinatura de um termo de ajustamento de conduta, de
forma espontânea. O inquirido não é obrigado a assinar termo de ajustamento de
conduta, embora deva ser esclarecido pelo membro do Ministério Público,
condutor do inquérito, de que, não havendo adequação às disposições legais
violadas, medidas judiciais serão tomadas, como o ajuizamento de ação civil
pública e que, conforme o caso, serão remetidos dados a outros órgãos públicos
para a tomada de providências nos seus respectivos âmbitos, inclusive para a
instauração de procedimentos criminais, se a conduta irregular também tiver
irradiações no campo penal, como ocorre com certa freqüência.
É
claro que como importante instrumento que é o inquérito civil submete-se ao
controle de legalidade por parte do Judiciário, tanto no tocante à instauração,
como no curso da sua instrução. Isto pode acontecer na ocorrência de medidas
ilegais de caráter restritivo contra as liberdades pessoais e de atos que
importem violação a direito líquido e certo do inquirido. Todavia, a mera
instauração de um inquérito civil não representa qualquer constrangimento
ilegal ou violação a direito líquido e certo a desafiar a busca de remédios
judiciais, pena de se considerar o seu autor como litigante de má-fé.
Também
não cabe medida correicional perante a Corregedoria Geral do Ministério Público
do Trabalho, como pretende alguns advogados de inquiridos, muitas vezes com o
fito de amedrontar o órgão condutor do inquérito nas suas investigações,
ressalvado a hipótese de ocorrência de abuso de poder, o que não se confunde
com a atuação firme do procurador na investigação e instrução do inquérito no
âmbito da sua independência funcional (CF, art. 127, § 1º).
O
inquérito civil é instaurado por portaria ou despacho ministerial no
acolhimento de denúncia recebida ou, de ofício; em seguida passa-se à sua
instrução mediante coleta de provas (oitiva de testemunhas, juntada de
documentos, realização de vistorias, exames e perícias) e, finalmente, chega-se
à fase de conclusão, propendendo o órgão condutor pelo arquivamento do
inquérito (por adequação de conduta, inexistência da irregularidade denunciada,
perda de objeto, etc.) ou pela propositura de medida judicial cabível na
espécie.
A
instrução do inquérito civil é da maior importância, porque com base nas provas
colhidas será ou não ajuizada a ação pertinente. É na instrução que o órgão
agente colherá elementos de convicção para o ajuizamento adequado e responsável
da ação civil pública; não se convencendo, depois de encerrada a instrução, da
ilegalidade do ato denunciado ou da existência de qualquer prejuízo para os
interesses metaindividuais, o órgão condutor do inquérito o arquivará,
remetendo-o ao Conselho Superior da instituição, no prazo de três dias, para
homologação, sob pena de incorrer em fala grave. Recusando-se este a homologar
o arquivamento, será notificado o ou o Procurador-Chefe da regional, conforme o
caso, para designar outro membro do Ministério Público, para: a) prosseguir nas
investigações, caso se entenda insuficientes as até então realizadas; b)
instaurar inquérito civil, se se tratar a homologação de arquivamento de peças
informativas ou; c) para ajuizar a correspondente ação (artigo 9º e §§, da Lei
7.347/85).
Para
instruir o inquérito civil, a lei armou o Ministério Público de amplos poderes
instrutórios na busca dos elementos de convicção, necessários à boa instrução
do procedimento e da provável ação civil pública a ser ajuizada.
Assim,
estabelece o art.10 da Lei 7.347/85 que constitui crime, punido com pena de
reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos, mais multa de 10 (dez) a 1.000 (mil)
Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTN, a recusa, o retardamento ou
a omissão de dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil, quando
requisitados pelo Ministério Público.
Como
se vê, o Ministério Público, para instruir o inquérito civil ou outro
procedimento administrativo, não pede; ele requisita e, se a sua requisição não
for cumprida, pode e deve pedir a instauração de processo crime para apurar a
conduta de quem de direito.
As
requisições do Ministério Público, hoje, têm assento constitucional, como se
infere do dispositivo a seguir transcrito:
Art.129. São funções institucionais
do Ministério Público:
VI - expedir notificações nos
procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e
documentos para instruí-los na forma da lei respectiva.
A Lei
Complementar 75/93 (Lei Orgânica do Ministério Público) também dispõe a este
respeito, dizendo:
Art.8º. Para o exercício de suas
atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua
competência:
IV - requisitar informações e
documentos a entidades privadas.
Esses
dispositivos constitucionais e legais dão amplos poderes ao órgão ministerial
para que possa fielmente cumprir suas funções institucionais na defesa dos
interesses da sociedade, das quais não se desincumbiria a contento se tivesse
que pedir informações e documentos necessários ao esclarecimento das
irregularidades denunciadas e ao ajuizamento da ação civil pública. Não
existissem a obrigatoriedade mencionada e sanções respectivas, poucos
atenderiam às solicitações do Ministério Público, especialmente os inquiridos
que não têm nenhum interesse em fazer prova contra si, como é natural.
Assim,
em nenhuma hipótese a requisição poderá ser negada, sendo que o desatendimento
pode caracterizar crime de prevaricação ou desobediência (RT 499/304), conforme
o caso (CP 319 e 330).
Cabe
ao MP, também e sempre que necessário, requerer a condução coercitiva de
pessoas para deporem sobre fatos indispensáveis ao esclarecimento e ajuizamento
da ação civil pública, mediante força policial (LC 75/93, art. 8º, inciso IX).
Essa medida, que pode acarretar restrição ao direito de ir e vir, deve ser
imposta somente quando absolutamente indispensável e mediante cautela.
Portanto,
o inquérito civil, como moderno instrumento de defesa da sociedade, através do
qual o Ministério Público, intenta a defesa dos interesses difusos, coletivos e
individuais homogêneos, é instrumento exclusivo do MP, cuja instauração é
sempre obrigatória, diante de fatos que vislumbrem a existência de ofensa aos
direitos e interesses metaindividuais, sendo assegurados ao MP, por isso, amplos
poderes para sua instrução.
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